Por Hunter
Meu primeiro contato com o Baco foi graças a um ex. Queríamos uma música para dedicar um ao outro e “Te Amo Disgraça” foi nosso clichê perfeito. Quando vi a capa do álbum – um homem em frente a uma catedral com a palavra “Jesus” riscada para virar “Esú” – senti como todo “macumbeiro” sente quando anda de guia na rua e encontra outra pessoa de guia.
Foi amor à primeira música. “Abre caminho” e “Esú”, e a frase “Entre o Machado de Assis e o machado de Xangô”, que se tornou meu lema por muito tempo. Quando “Bluesman” e a informação da sua bipolaridade chegaram até mim, nunca vou esquecer de estar em prantos, odiando a mim mesma, enquanto minha mãe me mostrava milhares de matérias do Baco sobre sua relação com o transtorno.
Ele dizia em alto e bom som, “a arte me salvou da bipolaridade”. Ficamos o dia inteiro ouvindo suas músicas. Ao contrário dos demais, eu sempre soube que “Me Desculpa Jay-Z” não era uma canção de amor.
“Quantas vezes você já foi amado?” foi o álbum que me empurrou para os dois melhores shows da minha vida: o festival Rock The Mountain em novembro de 2022, caindo de amores e dedicando minhas músicas favoritas para o menino que estava namorando, e agora, no dia 20 de maio de 2023, na melhor companhia possível: a do meu irmão.

O show começou. Uma mulher linda se pôs em frente ao microfone e cantou a primeira música, uma que sempre me arrepia e me dá vontade de chorar; uma cantiga em yorubá, que poucos pareciam entender ou cantar de volta, mas eu cantei a plenos pulmões algo que em português, soa como: “Esú é caminho, nós brincamos com o senhor do destino no alto da montanha, Esú é caminho e nós o saudamos.”
E sim, Esú é caminho.
Baco canta todas as coisas que nunca consegui escrever, e toda vez que fala assim da nossa fé, caminha para quebrar os estereótipos que as pessoas têm sobre a religião. Se você dedicou “Cigana” pra sua namorada, aposto que ao descobrir que ele escreveu essa música para a pomba-gira da sua mãe de santo, você viu que o que acontece dentro dos terreiros não é um bicho de sete cabeças.
Um moço pegou um microfone e gritou “facção carinhosa”, e toda plateia respondeu “ei ei”, e daí, o show continuou. Pedi desculpas para Jay-Z várias vezes, quebrei meu celular, dancei numa roda punk, chorei muito, e vou te falar? Não me arrependo de nada.
Estar num local cheio de pessoas cantando pontos tão demonizados pela sociedade cristã, gritando “Laroyé”, com um tridente aparecendo no telão, é tudo que a gente precisa depois de passar por um caminho cheio de olhares tortos.
Então, eu digo “facção carinhosa” e vocês dizem…
Foto de capa: Mario Cravo Neto, Gabriel Sicuro, Eric Mello/Divulgação
Crônica de Hunter, com edição de texto de João Pedro Agner.
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