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Coletivos promovem ações contra o Covid-19 em favelas do Rio

Devido a enorme desigualdade social, o combate ao vírus se torna mais difícil em regiões carentes

Mais de três meses após o primeiro caso de Covid-19 confirmado no Brasil, o governo ainda não possui um método efetivo de combate ao vírus dentro das favelas. Não há uma política direcionada especificamente para áreas carentes em todo o país, submetendo líderes comunitários e pessoas envolvidas com causas sociais a se mobilizarem para conseguir oferecer o mínimo de assistência a milhares de famílias carentes. 

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 6% da população brasileira reside em favelas. São mais de 11 milhões de pessoas desassistidas durante essa pandemia, vivendo em conglomerados, muitas vezes impossibilitados de manterem o isolamento social, dividindo a casa pequena com vários familiares. São 6.329 favelas distribuídas por todo o território nacional, dividas entre 323 municípios.  

São Paulo e Rio de Janeiro, como as duas grandes metrópoles do país, reúnem o maior número de casas situadas em favelas de acordo com dados do IBGE (gráficos abaixo) e são os dois estados com o maior número de casos de coronavirus.  

Até o dia 2 de junho, de acordo com dados oficiais no Ministério da Saúde, o estado de São Paulo somava 118.295 casos e o estado do Rio de Janeiro 56.732. Estando o país no ápice da pandemia, tendo até agora o maior número de mortes diárias também no dia 2 de junho, os moradores desses conglomerados se veem abandonados por seus governantes e perdidos em relação a seus futuros, pois o pós pandemia ainda é um questionamento para todos os brasileiros e a única certeza é que uma crise econômica difícil de superar começou a chegar e a tendência é piorar conforme se estende o período de pandemia. 

São muitos os desafios enfrentados pelas favelas diariamente, mas nesse momento em especial as desigualdades são evidenciadas. De acordo com a Doutora em Serviço Social, pesquisadora do Núcleo de Estudos de Política Social (NEPS) e professora da UVA, Vânia Dutra, os desafios são muitos, desde o cumprimento das medidas de isolamento social até o acúmulo de pessoas residindo no mesmo ambiente. Mais difícil ainda é manter as crianças em casa, considerando que sem aulas, o espaço da rua atua como “extensão de suas casas”. 

Até mesmo as medidas básicas de higiene indicadas pela OMS para prevenção do vírus se tornam difíceis. As lideranças comunitárias denunciam a falta de saneamento básico e, principalmente, a falta de água. O ato simples para muitas pessoas de lavar as mãos várias vezes ao dia, torna-se impraticável para os moradores. 

“Diante deste cenário percebemos que não foram propostas pelo poder público quer federal, estadual ou municipal para as favelas cariocas propostas para viabilizar o cumprimento das medidas básica de isolamento social, distanciamento, higienização e sanitização. ”  

Vânia Dutra

Outra questão é o auxílio emergencial, renda direta no valor mínimo de R$ 600 do Governo Federal para os trabalhadores informais, desempregados ou com Cadastro no Programas Sociais do Governo (CadUnico), é residual e temporário para famílias em situação de pobreza ou de extrema pobreza. Considerando os gastos de uma família hoje, o valor é muito baixo, mas esse ainda não é o maior problema. Dados, divulgados pela ONG Viva Rio, revelam que 31% dos moradores de favelas não têm conta em banco e não possuem familiaridade com os tramites relacionados. Portanto, a maioria é obrigada a ir para as filas enormes da Caixa Econômica para obter seu auxílio, se expondo ao vírus. 

“Podemos observar um movimento nas próprias favelas que denominam “nós por nós”, ou seja, os próprios moradores organizados em coletivos, ou gabinetes de crise, que fazem a comunicação com folhetos, rádio comunitárias, captação de cestas básicas,  medidas de sanitização das ruas e orientação aos moradores locais, uma rede de apoio.”

Vânia Dutra

A mobilização dos líderes sociais 
Colocadas sempre à margem da sociedade, muitas favelas possuem coletivos, grupos engajados, líderes sociais e ONGs assistenciais, ou seja, desamparados pelo governo, sem nenhum tipo de política pública efetiva, pessoas engajadas oriundas desses conglomerados encontram meios de se unirem de forma organizada para prestarem assistência aos demais moradores. São esses grupos que estão atuando diariamente no enfrentamento do Covid-19 nas favelas.  

Um dos exemplos é a Redes de Desenvolvimento da Maré, que tem como missão prestar assistência aos moradores do conjunto de 16 favelas da Maré, no Rio de Janeiro. Atuante em diversas áreas visando garantir os direitos da população, o projeto criou uma campanha denominada “Maré diz NÃO ao Coronavírus”, com o objetivo de tentar reduzir os impactos do vírus na favela. 

Neste sentido, o “Boletim do Olho no Corona!” foi criado pela equipe de pesquisadores das Redes da Maré para monitorar os casos confirmados e suspeitos do vírus, atualizados semanalmente. Até o último boletim, emitido no dia 28 de maio, haviam 390 pessoas com suspeita ou confirmação do Covid-19. Sendo 78% considerados por eles, invisíveis ao poder público, pois não tiveram acesso a testes.  

Com base nos dados do painel Rio Covid-19, dentro do boletim, entre os dias 18 e 25 de maio, o número de casos confirmados aumentou 60% na Maré. O boletim esmiúça todos os dados sobre os casos, como raça, sexo e faixa etária. É um balanço detalhado, que desenha como a desigualdade afeta a população nesse momento. 

O Jornal Voz das Comunidades, que originalmente cobre o dia a dia nas favelas do Complexo do Alemão, também fez um boletim que inclui os dados do Covid-19 nas maiores favelas do Rio de Janeiro. É atualizado diariamente e traz um balanço geral, contendo casos confirmados, óbitos, recuperados e ainda gráficos que fazem um comparativo.  

No Alemão foi criado um Gabinete de Crise com a união do “Coletivo Papo Reto”, “Mulheres em Ação no Alemão” e “Voz das Comunidades”, com o objetivo de fortalecer e ajudar o Complexo do Alemão durante a pandemia. A estratégia do gabinete tem duas frentes: comunicar de forma correta os moradores e monitorar o que é fakenews e quais informações precisam ser amplamente divulgadas dentro da favela; e incentivar o cuidado entre as pessoas, arrecadando alimentos e material de higiene.  

Raul Santiago, jornalista, responsável pelo Coletivo Papo Reto e um dos líderes sociais do Complexo do Alemão, faz a cobertura em suas redes sociais sobre o enfrentamento do Covid diariamente e diz que “os dados que são passados não estão condizendo com que estamos vendo aqui”. 

Na favela da Rocinha, o coletivo A Rocinha Resiste também criou diversas campanhas para auxiliar as famílias que necessitam, através de doações eles ajudam diversas famílias com alimentação e materiais de higiene. Eles precisam de toda ajuda necessária e de voluntários para atuarem no controle e distribuições.  

O momento clama por solidariedade e união entre a sociedade, os mais privilegiados precisam ajudar como puderem. Em cada um desses projetos é possível encontrar formas de ajudá-los a continuar auxiliando essas famílias.  

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Marina Figorelli – 7º Período

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