Comportamento

Como a geração Z encara relacionamentos com diferença de idade?

Pesquisa de opinião investiga o polêmico formato de relacionamento

É notável que, no mundo contemporâneo, se entra em contato com os mais diferentes tipos de relacionamento. Sejam os heteronormativos ou homoafetivos, relações monogâmicas ou poliamorosas, à distância ou morando juntos, casados ou ainda “ficando”, todas encontram suas particularidades e diferentes reações de quem assiste do lado de fora. Entre todas essas formas de afeto, pode-se observar que o tipo de relacionamento mais polêmico é entre parceiros com grande diferença de idade.

Exemplos desse formato de afeição podem ser observados todos os dias ao seu redor, sendo com alguém que se conhece pessoalmente, nos filmes ou com celebridades. Tome como exemplo “Me Chame Pelo Seu Nome”, filme de sucesso de 2017 abordando um relacionamento homoafetivo entre um casal de 17 e 24 anos; Fátima Bernardes e seu namorado 26 anos mais novo; Leonardo DiCaprio, de 47 anos, e sua fama de terminar relacionamentos quando sua parceira chega aos 25; o romance “Lolita”, de Vladmir Nabokov, um conhecido caso de pedofilia; o curta-metragem “All Too Well” de Taylor Swift, sobre uma jovem adulta se relacionando com um cara dez anos mais velho, refletindo situação semelhante vivida pela artista.

Mesmo na geração Z, considerada aberta, progressiva e receptiva à diversidade, o formato de relacionamento age gap ainda é tratado com olhar desconfiado e certa reprovação, ainda que parte deste grupo perceba a idade como “apenas um número”. Já que a parcela cautelosa é significativa, surge o questionamento: por que essa geração encara relacionamentos com um intervalo significativo entre as idades dessa forma? Qual o porquê de tanta restrição?

No filme “Me Chame Pelo Seu Nome”, a diferença entre os personagens é de sete anos, e entre os atores é de dez. O ponto mais criticado foi a aparência do mais velho, que não emula um jovem de 24 anos, passando a impressão de que a diferença é maior (Reprodução: YouTube)

Em pesquisa de opinião realizada pela Agência UVA, com público de 18 a 25 anos (geração Z), 56.5% dos entrevistados considera possível se relacionar com um parceiro no mínimo 10 anos mais velho. Para 63% dos entrevistados, esse tipo de relacionamento é aceitável dependendo do momento de vida dos envolvidos, enquanto 20% considera aceitável independente dos fatores. Os indiferentes somam 15%, e apenas 2% considera essa dinâmica desagradável. Mesmo assim, 96% dos participantes concordam que existem tabus em relacionamentos com distância de idade.

O estudante de Nutrição Gustavo Costa, de 23 anos, não vê problemas em se relacionar com uma mulher mais velha, acreditando que não existem tabus em relação ao assunto. Segundo ele, o que mais o interessaria numa mulher mais velha seria a maturidade. Matheus Baratta, de 19, também estudante, concorda que a maturidade seria um fator atrativo, mas receia que não seja suficiente para sua parceira, por não ter tantas experiências e vivência como ela. “O que poderia até dificultar a comunicação e a forma de ambos se expressarem”, diz.

Leticia Martins tem 19 anos e conta que seria muito difícil se relacionar com alguém de idade tão distante da sua nesse momento de sua vida. A estudante de Economia não acredita que tenha os mesmos objetivos de um homem acima dos 30. “Se eu tivesse 30 anos e o homem 40, acho que não seria tão ruim, porque muitas experiências já se intercalam”, diz. Para Leticia, seu maior receio é se sentir deslocada na vida de seu parceiro, além de temer a sexualização de mulheres jovens por homens mais velhos.

“Existem tabus com esse tipo de relacionamento, e alguns são justos. A mulher, que costuma ser mais nova, é caçoada e objetificada por namorar um homem mais velho, enquanto o homem é visto como sortudo. Teria medo de me sentir como um fetiche”, observa a estudante.

Já a estudante Nicole Bomfim, 19 anos, prevê que teria alguma insegurança nesse tipo de relacionamento por seu parceiro ser mais experiente e “vivido”, mas não descartaria um relacionamento caso realmente gostasse de seu par, acreditando que teria muito a aprender com ele. “Medo também seria de nossas opiniões serem muito contrárias em algumas situações. Por ele ser mais velho, pode ser um pouco mais conservador”, analisou a estudante.

A psicóloga Louise Madeira é terapeuta especialista em casais, família e sexualidade. Ela acredita que existe uma liberdade para relacionamentos atualmente, mas que, em caso de dificuldade, o lado mais prejudicado será o feminino, tocando na questão do envelhecimento.

“Nossa sociedade ainda é machista e patriarcal, e a juventude, assim como a pressão estética, não são pedidas ao homem com a mesma agressividade”, pontua a terapeuta.

Louise complementa que a pressão estética pode prejudicar como uma mulher se vê em um relacionamento, e que a situação se inverte quando é ela o par mais velho: “Entre um homem e uma mulher jovens, a pessoa com mais dificuldade a se relacionar com uma pessoa mais velha seria um homem”, alega Louise.

Uma das produções mais recentes da Globo, a novela “Um Lugar ao Sol” abordou os dramas do relacionamento entre os personagens de Andrea Beltrão e Gabriel Leone, que tem 30 anos de diferença (Foto: Reprodução/Globo)

Lucas Souza, estudante de 20 anos, é um homem gay e prioriza relacionamentos com homens em sua faixa de idade por prezar pelo equilíbrio entre as prioridades do casal.

“Tenho apenas 20 anos, e por ser gay, acabei me privando e sendo privado de várias experiências durante a adolescência. Participo delas só agora, e uma pessoa na casa dos 30 pode já ter passado por todas essas vivências. Isso pode acabar nos distanciando, ou até mesmo nos fazer abrir mão de coisas que não iríamos querer caso estivéssemos com parceiros mais compatíveis”, reflete Lucas.

De qualquer forma, Lucas não descartaria sentimentos caso fossem fortes e revela que a bagagem de seu parceiro poderia influenciá-lo em direção a um possível romance. “Gosto de gente que tem assunto, histórias para contar, e que já viveu muita coisa. Isso, em particular, sempre me atraiu em homens mais velhos”, conta. O estudante não tem nenhum tabu com esse formato de relacionamento, mas teme que possa se tornar algo muito sexual. “As pessoas atribuem [esse relacionamento] a um fetiche, uma fantasia, então acabam não levando a sério.”

O publicitário Breno Dias, de 22 anos, está em um relacionamento com um homem de 40. “Curto a mentalidade, o jeito que meu parceiro curte a vida, a forma dele ver uma situação a qual eu, sendo mais novo, estou passando”, conta.

Para Louise, no universo LGBTQIA+ a resistência ocorre com menos frequência. Por conta da comunidade já ser vítima de tantos preconceitos e rejeições, há uma diminuição do peso de estereótipos para essas pessoas, então, a abertura para suportar essas diferenças seria mais fácil. A psicóloga aponta, entretanto, que existe uma diferença entre se relacionar e buscar por esse tipo de relacionamento. 

“O amor tem passado por uma perda de paradigmas rígidos e irrevogáveis. Vivemos um período de amores mais livres, então as pessoas estariam abertas para se relacionarem com alguém diferente, seja muito mais velho ou muito mais novo. Mas, se a pessoa está a procura, isso pode significar algum traço psicológico em sua biografia que signifique uma busca por mais maturidade, estabilidade e conforto emocional”, observa a terapeuta.

Em novembro de 2021, a cantora Taylor Swift lançou um curta-metragem para acompanhar sua música “All Too Well”, reflexo de um relacionamento onde a cantora era nove anos mais nova que seu parceiro. Estrelado por Sadie Sink (Stranger Things) e Dylan O’Brien (Teen Wolf, Maze Runner), o projeto acompanha os altos e baixos do relacionamento, seguindo a composição lírica da música. Em um dos trechos, a cantora relata: “Você me disse que se tivéssemos idades mais próximas isso teria funcionado”.

Taylor não é a única artista a abordar essa temática na música. O mesmo foi feito por Demi Lovato, Troye Sivan, Adele, Amy Winehouse; artistas que já passaram por situações similares.

A exposição de casos como esses por meio de expressões artísticas no entretenimento tem sido benéfica para iniciar reflexões, garantindo que a geração Z seja mais assertiva de seus desejos e expectativas em um relacionamento, e capaz de explorar sua sexualidade com mais consciência e consentimento.

Repórter João Pedro Agner com edição de texto de Gabriel Folena

Foto de capa: Reprodução/YouTube

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