Há 200 anos, no dia 7 de setembro de 1822, às margens do Rio Ipiranga, localizado hoje em São Paulo, D. Pedro I declarou a Independência do Brasil em relação ao domínio de Portugal. O marco histórico pode parecer simples ou até aleatório, mas segundo o especialista Guilherme Braga, historiador e professor de História, o “Grito do Ipiranga” foi a consequência de muitas lutas e disputas travadas em solo nacional.
O processo, na verdade, iniciou-se em 1808, durante o Período Joanino, e ocorreu após a junção de fatores internos e externos à colônia, entre eles: a pressão do povo português pela volta de Dom João VI ao trono luso, a crise do sistema colonial e a influência das emancipações ocorridas nas Américas Inglesa e Espanhola, respectivamente.
Para Guilherme, o contexto internacional, marcado pela Revolução Francesa e ideais iluministas, somado aos benefícios adquiridos pelo Brasil com a chegada da coroa portuguesa, fizeram com que a sociedade colonizada lutasse por sua autonomia.
“Com a vinda da família real ao Brasil em 1808, passamos a ter um cenário de liberdade econômica, porque essa chegada abriu os portos brasileiros e acabou com o pacto colonial. A elite brasileira pôde desfrutar um pouco do poder de comércio com os países que quisesse. O que acabou gerando, dentro dessa elite colonial brasileira, a sensação de prosperidade”, contextualiza o professor.
O historiador conta ainda que, quando a família real retorna para Portugal, começou uma pressão grande dos portugueses pela retomada do pacto colonial (acordo de exclusividade comercial, em que a produção açucareira no Brasil, por exemplo, não poderia ser comercializada com outras nações, mas apenas com Portugal), e quando a elite brasileira bate o pé e pressiona D. Pedro I, ocorre a Independência.
Durante o período em que a família real refugiou-se no Brasil, a colônia desfrutou de uma série de melhorias, como a abertura dos portos, a construção da primeira Universidade, teatros, chegada da Imprensa Régia, entre outras. Diante da possibilidade de perderem todas as vantagens conquistadas, as elites coloniais, sob influência de outros movimentos libertários, pressionaram pela permanência de D. Pedro I.

Guilherme conta que a Independência foi um longo processo marcado por muitos conflitos, até a chegar ao Dia do Fico. Ele exemplifica o caso da Bahia, onde a população, principalmente mulheres, negros e indígenas batalharam contra as tropas militares portuguesas no Recôncavo baiano. As lutas independentistas se intensificaram a partir de fevereiro de 1822 e perduraram até o mês de julho do ano seguinte, quando os combatentes portugueses se renderam.

(Reprodução/Biblioteca Nacional da Austrália)
“No caso da Bahia, talvez foi um dos desdobramentos mais populares das guerras da Independência que aconteceram no Brasil. Uma figura muito emblemática é a de Maria Quitéria, uma mulher que, escondida, ingressou nas forças armadas pela independência e acabou sendo alçada à condição de heroína nacional. Ela representa não só a participação de mulheres como também a de camadas populares nesse processo”, ressalta o historiador.
Por isso, o estado baiano celebra no dia 2 de julho, com festas populares e desfiles, a expulsão do exército luso.
A partir de então, o País que fora colônia de Portugal por quase três séculos conquistava o status de uma nação autônoma rumo ao progresso econômico, político, cultural e social. Entretanto, desvencilhar-se da metrópole não foi uma tarefa fácil. Até os dias de hoje, costumes portugueses e referências coloniais estão presentes no cotidiano da população brasileira.
Na música, o piano e violino são alguns dos instrumentos trazidos pelos colonizadores. Na cultura, uma das principais festas do Brasil, o Carnaval, é uma herança de origem portuguesa. Inicialmente era manifestado por meio do “entrudo” e, posteriormente, escolas de samba, axés e frevos foram acrescentados na maior festa popular brasileira. Além disso, o professor de História acrescenta que a estrutura do idioma brasileiro também é baseada na Língua Portuguesa.
“Até quando pensamos nas letras das escolas de samba, principalmente na quantidade de sílabas, há um pouco dessa linha da literatura e dos poemas portugueses”, diz.
Há dois séculos, o Brasil tornava-se uma nação, estruturado por uma forma de governo e constituído por leis. De lá para cá, a sociedade brasileira se viu diante de repúblicas oligárquicas e ditaduras até chegar ao regime democrático. Para o historiador Guilherme Braga, no entanto, mazelas sociais permanecem fazendo parte do cenário brasileiro.
O professor acredita ser importante refletir sobre os direitos e deveres dos cidadãos e políticos.
“O mais importante seria entender que a emancipação do povo brasileiro ainda não aconteceu. Ainda vivemos uma situação em que o povo não tem acesso ao básico, como saneamento, saúde, educação, e alimentação. É um país que, de tempos em tempos, volta a colocar boa parte da sua população na miséria, e que ainda tem heranças de um passado escravocrata”, reforça o historiador.
Os esqueletos no armário da Independência do Brasil
Para quem quiser saber mais sobre a Independência, o jornalista Tiago Rogero, produtor do podcast “Projeto Querino”, fez um episódio inteiro sobre o tema.
“Quer conhecer uma versão mais completa do que realmente aconteceu em 7 de setembro de 1822? O primeiro episódio do Projeto Querino (abaixo) é um mergulho na Independência do Brasil. Uma História que vai muito além do mito do Grito do Ipiranga”, diz ele em seu Twitter em referência ao programa “A grande aposta”.
Em oito episódios, a série mostra como a História explica o Brasil de hoje. “Uma história que talvez você ainda não tenha ouvido, lido ou visto”, dizem na sua descrição. Idealizado e apresentado pelo jornalista Tiago Rogero, o podcast é uma produção da Rádio Novelo.
Foto de capa: Agência Brasil
Repórter Isabelle Valente com edição de texto de Gabriel Folena
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