Alguns preferiram esperar por sua vez fora do carro, tomando um sol matinal e fazendo piquenique. Mesmo em grupo de conhecidos, os idosos não abriram mão das máscaras. Isa de Carvalho, de 82 anos, juntamente aos amigos, aguardava ansiosamente o tão esperado momento. “Vai ser melhor eu estar vacinada, pois previne a doença. Aconselho todos a fazerem a mesma coisa! Usem máscara e respeitem o próximo, para não pegar a doença. Não tenham medo de se vacinar! É muito bom!”, afirmou, empolgada. A resposta de seus amigos foi a mesma e, no fim, em um consenso mútuo, afirmaram que todos devem se vacinar, independentemente da idade. O importante é se proteger.
O início tardio da vacinação no Brasil causou grande tumulto entre um dos principais grupos prioritários: os idosos. No país, a imunização começou em fevereiro deste ano, enquanto em outros países, a data inicial foi dezembro. A expectativa era de que pessoas de 60 a 100 anos fossem imunizadas o mais rapidamente possível, mas a realidade foi diferente em terreno brasileiro. O atraso aumentou a expectativa, mas não tirou a esperança dos idosos em ver o sol brilhar novamente.
Não é à toa que, ao redor do mundo, a vacinação começou por quem já viveu mais de seis décadas. Estudos feitos pela Universidade do Colorado em Boulder, nos EUA, utilizam números para analisar o porquê de os idosos serem os primeiros vacinados. As informações coletadas incluem o número de pessoas que já testaram positivo para a Covid-19, a velocidade com que as vacinas estão sendo aplicadas e sua eficácia estimada.
Foram simulados cinco cenários diferentes, nos quais seriam vacinados crianças e adolescentes; adultos entre 20 e 49; adultos a partir de 20 anos; adultos a partir de 60 anos (levando em consideração que cerca de 30% poderiam se recusar a receber a dose); e qualquer pessoa que quisesse a vacina enquanto os estoques durassem. O artigo constatou que, em todos os países onde o estudo foi aplicado, o grupo que apresentou melhor resultado de diminuição do número de mortes foi o de idosos.
Uma vez constatada a eficácia e a importância de começar a imunização pelos representantes da terceira idade, assim que as primeiras vacinas foram disponibilizadas, o Brasil começou a proteger a população idosa. Em Cabo Frio, a vacinação de pessoas entre 85 e 89 anos teve início no dia 3 de fevereiro, em Escolas Municipais espalhadas entre o primeiro e segundo distritos. Dentre um dos locais mais procurados pelos idosos, está a Escola Municipal Edilson Duarte, localizado na rua Amélia Ferreira, no Jardim Caiçara.
O medo era nítido e, por isso, houve quem se recusasse a tomar a vacina. Muitas vezes, informações coletadas por meios duvidosos, como fakes de WhatsApp, prejudicaram a aceitação de todo o grupo. José Nogueira, de 82 anos, criticou esse tipo de posição. “Acho de uma ignorância tremenda, porque a tendência é, se não tomar a vacina, pegar o vírus facilmente e acabar morrendo”, enfatizou.

Foto: Ludmila Lopes
O nervosismo para a realização de algo que havia se tornado um sonho era extrema. “Não esperava essa quantidade de pessoas e de carros”. Mesmo decepcionado com a demora, não perdeu as esperanças e garante que as expectativas após tomar a tão esperada dose são as melhores. “Depois que tudo isso acabar, vou festejar! Fazer um churrasco”.
Victor Rodrigues, de 80 anos, também se demonstrou ansioso com os resultados da imunização. “A expectativa é boa. A nossa esperança é que dê certo, porque do jeito que está essa doença por aí… A gente vê muita gente aí indo embora, então temos que pensar positivo”.
Vale pontuar que a imunização não é aguardada apenas pelos idosos, como também por seus familiares. Lúcia Dias Oliveira, 68 anos, estava acompanhando sua irmã, Sidinéia Dias de Oliveira, de 78. A aposentada afirmou que a maior expectativa de todas depois da vacina é “abraçar muito”.
Profissionais de saúde também se emocionam
Mas o clima de ansiedade não atinge apenas o público-alvo. Os enfermeiros, que estão na linha de frente da imunização, também se emocionam diariamente com as cenas que vivenciam. Alberina Cristina, de 39 anos, comenta sobre as experiências que tem tido com seus colegas de trabalho. “Uma senhora levou a família toda, e ficaram afastados, esperando. Quando o número dela foi chamado, todos gritaram, batendo palmas, como se fosse um prêmio muito importante”, contou.
A enfermeira, que trabalha na ESF do Jardim Caiçara, localizada na rua Inglaterra, Cabo Frio, disse também que “nem tudo são flores”. “As vacinas chegam aos poucos, e temos que ir imunizando por idade e comorbidades. Por muitas vezes, algumas pessoas, com medo e ansiedade para serem vacinadas, são agressivas, tanto verbal, quanto fisicamente. Não entendem que a produção de vacina não acompanha o tamanho da população”. Mas, mesmo com os empecilhos, Alberina afirma que o trabalho é edificante. “Apesar de tudo, me sinto feliz por estar fazendo parte da história dessas pessoas. Estamos cuidando do amor de alguém. Um fundador de uma família inteira”.
Mesmo com os empecilhos, após conseguirem a tão estimada primeira dose, os idosos não conseguiam esconder a felicidade, como foi o caso de Carlos Henrique, de 87 anos. Com o adesivo contendo os dizeres “Eu me vacinei” colado no peito, ele era só felicidade pela rua. Além dele, toda a família aguardava ansiosamente por aquele momento. “Meus filhos, netos, todos estavam ansiosos. Apesar de ser só a primeira dose, temos que nos precaver, de qualquer jeito”, afirmou.

Foto: Ludmila Lopes
Além dos postos de saúde, o município também optou em realizar a vacinação em sistema Drive-Thru, no Novo Portinho. O local, que tinha como maior intuito evitar as aglomerações, não perdeu para os ESF de cada bairro. De acordo com informações, carros começaram a chegar no local por volta de 3h da manhã.
Sueli Lima, de 77 anos, afirma que optou pelo local por conta da proximidade de sua casa, mas que não esperava pelo tamanho da fila. “Chegamos aqui por volta de 8h. Estamos esperando duas horas e pouquinho”. Disse também que, por mais que seja difícil, está respeitando a quarentena. “Sem sair de casa”, garantiu.

Foto: Ludmila Lopes
Alguns preferiram esperar por sua vez fora do carro, tomando um sol matinal e fazendo piquenique. Mesmo em grupo de conhecidos, os idosos não abriram mão das máscaras. Isa de Carvalho, de 82 anos, juntamente aos amigos, aguardava ansiosamente o tão esperado momento. “Vai ser melhor eu estar vacinada, pois previne a doença. Aconselho todos a fazerem a mesma coisa! Usem máscara e respeitem o próximo, para não pegar a doença. Não tenham medo de se vacinar! É muito bom!”, afirmou, empolgada. A resposta de seus amigos foi a mesma e, no fim, em um consenso mútuo, afirmaram que todos devem se vacinar, independentemente da idade. O importante é se proteger

Foto: Ludmila Lopes
MUITO MAIS QUE UMA VACINA, UMA NOVA FORMA DE RETOMAR A REALIDADE
Além da pandemia de Coronavírus, para Juarez Medeiros Cardoso, de 87 anos, o ano de 2020 foi extremamente difícil. O morador de Cabo Frio perdeu a esposa, Anália Francisca de Cardoso, 83 anos, com quem mantinha um casamento de 60 anos, para um câncer terminal. Ao precisar de apoio dos familiares mais próximos, se viu isolado da maioria das pessoas com que sempre conviveu por conta da Covid-19. Com a chegada da vacinação do município, Juarez foi um dos primeiros a ser vacinado, enxergando dessa forma, uma nova forma de seguir a vida.

Foto: Acervo do Coral
Juarez precisou abrir mão de suas aulas do Coral Despertar – Alegria de Viver, no qual sempre foi um aluno assíduo. Apesar de a atividade ter retornado de forma remota, ele optou por aguardar o término da pandemia, por preferir o sistema presencial. A realidade é que o idoso viu sua vida mudar da água para o vinho em questão de meses. “Meu pai sempre foi muito ativo: farmácia, mercado, feira, Coral. De repente teve que ficar preso dentro de casa, compreender a importância do uso da máscara, álcool gel, constante higienização das mãos”, disse Tânia Cristina Medeiros, filha mais nova de Juarez.

Juarez e sua filha Tânia
Foto: Acervo Pessoal
Por conta do avanço da idade, após o falecimento de Dona “Naná”, como era carinhosamente chamada, Juarez precisou da presença dos filhos que, mesmo com o receio pelo vírus, não abriram mão de estar ao lado do pai. “Mais do que nunca, a presença dos filhos se fez necessária para apoiar e demonstrar o quanto somos privilegiados de poder compartilhar da sua companhia”, afirma a caçula.
Mesmo com os cuidados redobrados, o medo de o idoso contrair o vírus afligia a todos. A chegada do imunizante em Cabo Frio foi como uma dose de vida extra, tendo em vista que Juarez estava em um dos primeiros grupos a ser imunizado, por conta da idade. “A vinda da vacina veio amenizar um pouco esses sentimentos conturbados na esperança de uma normalidade, que sabemos nunca mais será a mesma, mas que poderá ser suavizada com o retorno às atividades a que estava acostumado”, diz Tânia.
Juarez recebeu a primeira dose da vacina Oxford Astrazeneca, no dia 3 de maio, na Escola Municipal Edilson Duarte, onde inicialmente estavam sendo aplicadas as imunizações. “Estou ansioso para receber a segunda dose, para poder sair de casa, viajar de ônibus e voltar para o coral”. A esperança do término deste difícil momento foi o assunto mais abordado pelo aposentado. “Vai demorar um pouco ainda, mas vai acabar, se Deus quiser”. Por mais que vacinação concluída tranquilize Juarez, a família ainda tem seus receios pela falsa sensação de segurança que o idoso acredita que vai receber.

Foto: Ludmila Lopes
Por conta da chegada de novas cepas do vírus, como a Variante Indiana, a Organização Mundial da Saúde (OMS) indica que, mesmo com as duas doses da vacina, a pessoa utilize máscara, continue mantendo o isolamento social e use continuamente o álcool em gel. A maior preocupação dos filhos de Juarez é o excesso de coragem e segurança após a imunização completa. “Meu medo é ele achar que está 100% imune, se descuidar. E isso está muito distante de acontecer, devido ao pouco número de pessoas vacinadas”, diz Tânia.
Não é só Juarez que apresenta esse tipo de reação. De acordo com a psicóloga Denise Conceição Paranhos da Paixão, a chegada da vacina causou muitos impactos sobre quem permaneceu tanto tempo recluso. “Penso que a vacina foi vivenciada, por muitos, como a chegada da liberdade. Com o isolamento, o exercício do contato interpessoal com as pessoas significativas ficou afetado e atravessado por várias questões. E aqueles idosos que, por alguma limitação, não puderam ultrapassar as barreiras da interação física, e construir e reconstruir novas formas de sentido e atividades pessoais, foram afetados e desenvolveram respostas emocionais de estresse e sofrimento psíquico”, afirma.

Foto: Acervo Pessoal
Ainda de acordo com a profissional, o isolamento em si não é algo fácil, mas ao aceitar a realidade e seus limites, a adaptação acontece da melhor forma possível. “Tanto no período da infância quanto no do envelhecimento, o tempo é vivenciado com transformações físicas facilmente notadas. Muitos idosos vivem experiências de ver seu tempo se esgotando na pandemia, e isolados. Precisamos ajudá-los a ultrapassar a experiencia de controle total desse tempo, e promover a consciência das escolhas que envolvam vida, dignidade e bem-estar”, diz.
Para diminuir o impacto do isolamento na terceira idade e prevenir depressão nesse grupo, o indicado é disponibilizar atendimento com psicólogos, mesmo que de forma remota. A partir disso, os idosos podem expor seus receios sobre a atual situação da pandemia e ouvir recomendações de um profissional capacitado.
Ludmila Lopes – 3º período
Parabéns, Ludmila! Bjs!
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