De segunda a sexta-feira, Luiz Rogério Bianco, 58 anos, professor, acorda pela manhã e cumpre a mesma rotina semanal: se levanta, toma seu café da manhã, assiste às notícias e se prepara para mais um dia de aulas. Durante as próximas quatro horas, o professor, que antes se dirigia até o trabalho, agora se desloca apenas de um cômodo ao outro. As salas de aula, antes lotadas de jovens prontos para o aprendizado, agora se resumem a turmas on-line com câmeras e microfones desligados, além de, muitas vezes, pouquíssima interação.

Foto: Larissa Celano
Implementado a fim de reduzir as aglomerações e frear o avanço do novo coronavírus, o ensino remoto tem seus prós e contras. Enquanto professores e alunos ganham com a comodidade do home office, perdem as interações e o dinamismo das aulas presenciais.
“Minha aula é muito expositiva, muito participativa. Tenho certeza de que os alunos não gostaram dessa forma remota. Ela é muito impessoal, muito fria, muito fechada. A aula tem que ter uma relação direta entre professor e aluno”, desabafa Jorge Luiz Fernandes, 66 anos, professor de geografia no setor privado.

Foto: Acervo Pessoal
Em geral, o salário permaneceu o mesmo, mas a carga horária aumentou significativamente. Professores, sobretudo os mais velhos e/ou com maior dificuldade para se adaptar à tecnologia, se viram sobrecarregados ao terem de reinventar suas aulas para atender às demandas dos alunos e colégios. Jorge destaca: “Se você analisar a relação capital-trabalho, você gasta a sua luz, gasta a sua internet, gasta a sua água, e no colégio você não gastava nada disso”.
No setor público de educação, a situação não foi muito diferente. A Prefeitura do Município do Rio de Janeiro criou, em fevereiro deste ano, o aplicativo Rioeduca em Casa como plataforma online oficial do ensino remoto. O professor DF*, que leciona em colégios do município, conta que a plataforma contou com baixa adesão dos alunos por conta de questões financeiras.
“A adesão às aulas remotas e atividades postadas na plataforma é próxima de zero, os alunos não têm condições para acessar. Além disso, o acesso que foi acordado como sendo gratuito é o uso apenas pelo celular, o que é ruim para professores que criam conteúdo e precisariam de acesso a um computador para trabalhar mais confortavelmente. Todo equipamento e gasto com informática e plano de dados estão saindo do bolso dos docentes”, diz o professor DF.

para uso no ensino remoto
Foto: Larissa Celano
As dificuldades financeiras enfrentadas pelo setor público quando se trata de tecnologia já existiam mesmo antes da pandemia. Em pesquisa realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) em 2019, 39% dos alunos do setor público não possuíam computadores em seus domicílios.
Entre colégios públicos e privados, 98% dos alunos acessavam a internet pelo telefone celular, dos quais apenas 18% acessavam exclusivamente pelo celular. Ao fazer a divisão entre setor público e privado, a diferença é maior: 21% dos alunos de colégios públicos acessavam a internet apenas pelo celular, contra apenas 3% dos alunos de escolas privadas.
Outra pesquisa realizada pelo Cetic.br no mesmo ano ilustra a percepção de professores de escolas públicas urbanas quanto à barreira no uso de tecnologias de informação nas escolas. Dos professores entrevistados, 70% concordaram que a baixa velocidade de conexão à internet dificulta muito o ensino.

O acesso ao aplicativo Rioeduca independe de acesso à internet e a utilização do material não consome dados móveis, de acordo com site da Prefeitura. Em dezembro de 2020, a Câmara dos Deputados havia aprovado o repasse de R$ 3,5 bilhões que seriam investidos no setor de educação, principalmente para a liberação de internet móvel gratuita para alunos de baixa renda com famílias inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), estudantes de comunidades indígenas e quilombolas, além de professores do setor público de ensino.
Apesar de aprovado pelo Senado em fevereiro de 2021, o projeto foi integralmente vetado pelo Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, em veto publicado no Diário Oficial da União do dia 19 de março. A justificativa: “A medida encontra óbice jurídico por não apresentar a estimativa do respectivo impacto orçamentário e financeiro. Além disso, a proposição aumenta a alta rigidez do orçamento, o que dificulta o cumprimento da meta fiscal e da Regra de Ouro”.

De volta ao presencial
No dia 6 de abril, a liminar que impedia a volta às aulas presenciais em escolas públicas e privadas no Município do Rio de Janeiro foi suspensa pelo desembargador Henrique Carlos de Andrade Figueira. Foi a partir daí que muitas instituições adotaram o chamado “ensino híbrido”, intercalando aulas remotas e presenciais.
O professor DF explica que no ensino público as aulas presenciais são divididas em grupos de cerca oito alunos, com aulas a cada quinze dias. Enviar ou não os filhos fica a cargo dos pais. Além disso, aulas remotas seguem acontecendo pela plataforma Rioeduca.
No setor privado, o colégio onde leciona forneceu equipamento digital e álcool em gel em sala de aula para professores sem comorbidades agudas que retornaram ao presencial. Houve um rodízio de grandes turmas com dezesseis alunos por classe, enquanto o restante assiste de casa. “Já dei aula para a sala vazia com todos de casa. Tenho hipertensão controlada, não grave. Tive que voltar de qualquer jeito ou perderia o emprego”, desabafa.

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Apesar do início da vacinação, no Brasil, o número de infectados e óbitos pelo coronavírus só cresce. De acordo com o Painel do Covid, ministrado pelo Ministério da Saúde a partir de dados das Secretarias Estaduais de Saúde no país, o mês de maio contou com mais de 1,8 milhão de infectados, além de mais de 59 mil mortos.
O médico André Fernandes reitera a necessidade de, agora mais do que nunca, manter as medidas de segurança a fim de evitar o contágio com o coronavírus, como o uso de máscaras, evitar aglomerações, fazer uso de álcool isopropílico em gel, lavar bem as mãos, retirar os sapatos na porta de casa e, principalmente, receber as doses da vacina assim que possível. Fernandes se diz favorável à volta às aulas no país.
“A gente está perdendo uma geração com a falta de acesso à escola. Não só nos colégios particulares, mas principalmente nos públicos. Sou a favor do retorno com as crianças mais espalhadas, sem hora de recreio, sem tumulto para entrar e sair, todo mundo de máscara, higiene, de preferência com os professores já vacinados. Não tem como essas crianças ficarem paradas. Um ano já se foi, agora perdeu outro e isso no futuro a gente vai sentir demais, esse baque da educação”, diz o médico.

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Mas nem todos pensam da mesma forma. Lecionando há mais de 25 anos, a professora LC* relata o medo ao retornar ao presencial um mês atrás. “Eu voltei por um mês ao presencial e me senti extremamente insegura e vulnerável. Retornei ao virtual. Acho que não existe protocolo eficaz no funcionamento de uma escola. O contato e a aglomeração são inevitáveis”, avalia ela.
Vale ressaltar que profissionais de educação do ensino básico público pertencentes a grupos prioritários começaram a ser vacinados com a primeira dose da vacina apenas no dia 16 de abril de 2021. Mais tarde, no dia 6 de maio, o Ministro do Supremo Ricardo Lewandowski suspendeu a liminar que incluía professores a agentes de segurança no grupo prioritário de vacinação no Rio, alegando risco de falta de segunda dose da vacina para idosos e grupos com comorbidades.
Apesar disso, a vacinação de todos os profissionais de educação foi retomada no dia 7 de junho, segundo calendário oficial da Prefeitura do Rio. Com nem mesmo metade da população já vacinada com a segunda dose da vacina contra o coronavírus, o Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer.
*Os nomes dos professores DF e LC foram trocados por iniciais para preservar as identidades.
Larissa Celano – 3º período
Parabéns, Larissa!!! Bjs!
Muito bom