Comunicação Geral

Retratando a realidade

Muitos não sabem, mas no exterior, o Brasil não é conhecido apenas pelo clima tropical, samba, futebol e telenovela; o gigante sul-americano também é famoso pela quantidade de datas comemorativas e feriados presentes no calendário – são mais de 200 por ano. Com isso, é normal que muitos destes dias passem despercebidos na agitada vida contemporânea. No livro “Datas Comemorativas e Outras Datas Significativas”, do Centro de Documentação e Informação da Câmara dos Deputados, lançado em 2012, o mestre-doutor Ricardo Oriá, da Universidade de São Paulo (USP) afirma: “Lembrar, esquecer e comemorar são ações de memória inerentes ao ser humano. Comemorar é típico das sociedades humanas. Não há país que, em seu processo de construção de sua identidade nacional, não promova e cultue seus fatos e acontecimentos mais relevantes para serem lembrados à posteridade, seja através do registro de sua história, seja na edificação de monumentos, seja na celebração de datas comemorativas e rituais cívicos”.

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Uma destas datas pouco lembradas é o cinco de janeiro, que ainda carrega um pouco da euforia da entrada de um novo ano. Trata-se da Criação da Primeira Tipografia no Brasil. Muitas pessoas podem indagar “E daí?” ao se depararem com esta informação, sem saber que este fato foi essencial para a liberdade de imprensa e para a editoração em solos tupiniquins. A tipografia é um processo de impressão posterior à xilografia – técnica surgida na China na primeira metade do Segundo Milênio – que possibilitou a aceleração da reprodução de conteúdo, uma vez que a xilogravura é composta por peças fixas a blocos de madeira – como carimbos – e a tipografia utiliza peças móveis, que permitem a reorganização e reutilização dos caracteres. Com isso, surgiram outros artifícios facilitadores de leitura que são utilizados até os dias atuais, como tipos de letra, espaçamentos entre linhas e paginação.

O início da tipografia no Brasil ainda é incerto e cercado de mistérios, pois, à época, o uso da nova tecnologia ainda era feito na clandestinidade devido à proibição da Coroa Portuguesa que afetava a manifestação livre de pensamento e a liberdade de expressão, visto que até mesmo a produção de jornais em terras brasileiras era terminantemente proibida. Um exemplo disso, é a saga da publicação “Correio Braziliense”, que era impresso na Inglaterra e “contrabandeado” para o Brasil. No entanto, todo este cenário mudou com a vinda da Família Real Portuguesa para a então colônia, no ano de 1808. A partir deste momento, iniciou-se o processo de libertação da informação em território brasileiro com a criação de instituições tais quais a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios e dois Colégios de Medicina e Cirurgia – um no Rio de Janeiro e outro em Salvador –, além do surgimento do primeiro jornal oficial da nação, a Gazeta do Rio de Janeiro. Portanto, é por este motivo que a criação da primeira tipografia no Brasil é tão importante, porque, a partir daquele momento até os dias de hoje, ela, muitas vezes aliada a fotografia, cumpre uma das funções mais fundamentais das sociedades humanas: retratar a contemporaneidade de cada época, para que a história não se perca.

Retratos da contemporaneidade

capaE como, ao longo dos anos, a fotografia se uniu à tipografia para desempenhar a função básica desta, que é levar informação à população, a evolução deste processo permite a realização de grandes feitos acerca de assuntos que devem ser discutidos em tempos atuais. Um exemplo disso é o livro “Mundo Desconhecido”, do produtor Alex Mehedff, lançado em meados de novembro último e que trata de um tópico muito relevante para o contexto político mundial.

Mehedff retrata no livro a recente experiência que viveu durante os 30 dias que passou na zona de guerra dos territórios curdos, onde acontecem os conflitos entre Iraque e Síria. A publicação contém cerca de 120 fotografias que retratam diferentes ângulos do combate ao Estado Islâmico, um dos grupos radicais mais temidos do planeta na atualidade. O autor explica que o objetivo original da cobertura do combate era a produção de uma série de tele documentários chamada “Zonas de Conflito” – uma proposta da Hungry Manaus Brasil, produtora da qual é sócio.

Um processo de produção como esse leva algum tempo para ser concluído. “Em março de 2015 a produtora veio com esta ideia, e a primeira temporada falaria sobre o conflito Síria-Iraque”. Além disso, seria uma oportunidade única para Alex conhecer a terra natal do avô paterno e as atuais condições da região. “Durante muitos anos, eu, meu pai e meu irmão conversamos a respeito, mas, por inúmeras razões, a oportunidade ainda não havia surgido”.

Durante a viagem, Alex não tinha a intenção de publicar um livro sobre os conflitos – as fotos tiradas por ele eram apenas registros e reflexões do processo de produção do programa até chegar à área onde viviam os antepassados de Mehedff; tanto que o produtor afirma que as fotografias contidas na obra não possuem cunho jornalístico. As imagens retratavam o cotidiano do front curdo – elementos como trincheiras, soldados peshmergas, líderes tribais, crianças e mulheres coexistindo em cenários que poderiam ser bombardeados a qualquer instante.

De volta ao Brasil, o autor trazia consigo um acumulado de mais de duas mil fotografias feitas ao longo dos 30 dias da viagem. No entanto, Alex não deu muita importância aos arquivos, até mostrá-los a amigos e familiares, que afirmaram que os registros possuíam uma grande carga emocional, a qual permeava os escombros, as marcas deixadas pelos disparos, os quartéis, mas, em especial, os costumes de um povo que vive da mesma forma há quatro mil anos, e, justamente por isso, recusa-se a se render e se tornar refugiado.

Para Alex, apenas esta resistência e respeito à tradição já justifica a publicação do livro. “Com exceção dos smartphones, úteis para registrar e divulgar as lutas, os signos de status da vida contemporânea não exercem nenhum fascínio sobre eles. Todos vestem as mesmas roupas, calçam os mesmos calçados, tomam chá em xícaras de um único modelo… Ninguém ali ambiciona uma vida diferenciada, pelo contrário, querem continuar sendo curdos, como foram seus pais, avós, bisavós, trisavós…”.

O livro “Mundo Desconhecido” é uma publicação da Editora Andrea Jakobsson Estúdio e já está disponível para vendas em lojas físicas e virtuais.


Daniel Deroza– 4º Período

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