No dia 13 de julho, estreia “Síndroma”, um musical autoral brasileiro escrito e dirigido por Jay Vaquer, com 40 músicas autorais, no teatro Prutendial, na Glória. O espetáculo conta com atores premiados em seu elenco. Jay Vaquer trabalha nesse projeto há mais de sete anos. Em 2015, montou o espetáculo “Cinza”, e desde então tem feito aperfeiçoamentos e mudanças no texto até chegar a “Síndroma”.
Com dez músicas retiradas do espetáculo, Jay gravou o álbum “Ecos do Acaso e casos do caos” em 2018, que foi indicado ao Grammy Latino na categoria “Melhor Álbum de Rock ou Música Alternativa em Língua Portuguesa”.
O musical conta a história da jovem Corina Gore (Brenda Pedrotti), que busca incessantemente por um sentido em sua vida que lhe traga conforto no reino distópico de Síndroma. Porém quanto mais procura, menos consegue encontrar. A peça aborda questões psicológicas, crenças e falta delas, o mundo que nos adoece e mais outras questões particulares e, ao mesmo tempo, universais.

A Agência UVA realizou uma entrevista com Jay Vaquer, criador, diretor e compositor do espetáculo, onde ele contou um pouco sobre o processo de criação, produção e ensaios do espetáculo, e o que o público pode esperar do musical.
Agência UVA: O que te inspirou a escrever o roteiro e as canções de ” Síndroma”?
Jay Vaquer: Foi um processo bastante espaçado, onde pude perceber o quanto a depressão é uma coisa cada vez mais presente na vida das pessoas, nos noticiários. E o espetáculo vem muito daí, de uma observação minha do que está acontecendo ao meu redor. Buscando razões, como funciona, em uma discussão prolongada sobre esse assunto. Eu passei recentemente por um espetáculo que se chama “Poema!”, que é um espetáculo feito por jovens, que precisavam aparentar 17 anos em média. Era impressionante a quantidade de jovens precisando tomar remédio tarja preta, com ataques de pânico e com questões sérias. “Síndroma” parte dessa observação assim como toda a minha obra desde o meu trabalho musical até o meu trabalho quanto dramaturgo, sempre nasce da minha observação.
AU: O projeto do musical já vem sendo trabalhado desde 2014, sofrendo diversas alterações, inclusive do título. Como foi esse processo de adaptação do espetáculo ?
JV: Eu sou formado em comunicação e artes cênicas, trabalhei nessa área na década de 90. O meu trabalho no teatro foi muito importante para minha formação, porém em 2000 lancei meu primeiro disco chamado “Nem tão são”, e fiquei majoritariamente dedicado a minha carreira musical. Retornei ao teatro porque eu estava levando muito o meu filho Taylor para assistir, e minha mãe, que também é cantora, estava no elenco de uma peça infantil e eu ia sempre. Foi quando me pediram para fazer músicas para uma peça “Peter Pan” e topei, porém não gosto muito desse esquema do teatro, onde entende o teatro infantil como um pretexto para vender pipoca, e percebi que havia uma preocupação maior com quantidade do que com qualidade. Logo, entendi que não conseguiria mexer nessa roda e fui buscar meu próprio caminho para fazer diferente. Fui construindo até 2012 até chegar no “Cinza” um musical adulto meu que estreou em 2015 e lá está um embrião do “Síndroma”.
Mesmo assim, senti que precisava de mais tempo para desenvolver aquela história e contar tudo que eu queria contar. Então entendi o que funcionava ou não, e realizava leituras de dois em dois meses, e em 2018 retomei o projeto e lancei o disco “Ecos do acaso e casos” com músicas retiradas da peça. No ano seguinte, começo os ensaios para a prática de montagem e, em 2020 quando estávamos para estrear, veio pandemia e tive que pausar o projeto. Depois foquei em outros projetos que estavam acontecendo simultaneamente, agora sinto que é hora de voltar e “resolver” o que ficou pendente.
AU: Como está sendo o processo de montagem do espetáculo, desde a escolha dos atores até agora, a uma semana da estreia?
JV: É um processo que não é fácil, pois não temos recursos, mas me sinto muito feliz e realizado. Não é fácil mas faço isso porque é isso que me realiza. Eu já sei que nessa montagem não teremos esse “mundo dos sonhos” porque não temos dinheiro. Essa montagem será uma versão mais enxuta, bem cuidada, no melhor possível que conseguirmos, valorizando um bom texto, boas músicas e boas atuações. Dito isso, eu estou muito feliz com o elenco, porque quando eu abri as audições para o espetáculo, sem o respaldo de nenhuma grande produtora do mercado, muita gente muito boa se inscreveu. Quando revelei a real situação para os atores escolhidos,de que não poderia nem dar um contrato com salário para eles, quase todos toparam continuar no projeto todos defendendo o projeto com muita garra e muita vontade de fazer acontecer.
A única coisa que me incomoda é um grande desequilíbrio étnico. Temos uma minoria de atores pretos no mercado. Infelizmente não consegui sanar com essas condições, e acho uma pena que grandes peças com patrocínio não tenham esse cuidado. Mas tenho muito apreço e respeito por aqueles que lá estão, são todos merecedores, talentosíssimos. Pessoas esforçadas, dedicadas que amam o que fazem e estão ali por amor mesmo, comprando briga pelo projeto mesmo sabendo do risco, uns guerreiros. E eles vão entregar um espetáculo muito bonito e estou muito animado.
AU : Como descreveria o reino de “Síndroma”? O que podemos esperar?
JV : Sem dar spoilers para estragar, mas assim como no “Poema!”, o “Síndroma” também guarda uma história que só será revelada mais para o fim do espetáculo. É uma história interessante de percorrer, o conto de fadas na busca de uma prevalência do bem sobre o mal. Um escapar da realidade elaborando esse lugar do final feliz. Mas lá você vai encontrar um mundo com muita hipocrisia e muita demagogia. Um espetáculo abrangente e, por isso, demorou muito tempo para chegar nesse lugar. O que podem esperar de um espetáculo denso, punk e que não duvido que algumas pessoas se sintam incomodadas, pois propõe imagens que podem causar incômodo, e ao mesmo tempo reflexões que requer tempo para entender. Eu pretendo lançar esse texto porque é um texto que pode ser muito apreciado na leitura.
AU: Qual público você acredita que vai se identificar com a jovem Corina e o que pretende instigar nele?
JV: Bom, primeiramente, eu acho que os questionamentos de Corina, e não só os dela como de outros personagens, são questões recorrentes, que vemos em muita gente e acho pouco provável que alguma coisa não “bata” em você, no sentido de você ter passado por isso ou conheça alguém que passe ou não tenha passado pelos mesmos questionamentos situações, dúvidas, inseguranças, anseios e receios. A gente consegue uma abrangência, que faz que eu diga isso sem medo de estar errado, pois é inevitável que alguém não se identifique com alguma coisa em algum momento. Então de certo modo, todo mundo pode se identificar, seja qual for a faixa etária. Uma coisa interessante que é abordada e é verdade, é que quando vamos ficando mais velho, nós não vamos obtendo mais elucidações e mais respostas para essas perguntas, pelo contrário; quanto mais velho menos a gente tem as respostas, vamos concluindo que a gente achava que tinha e, na verdade, não temos certeza absoluta de algumas coisas.
AU : Esse espetáculo aborda temas como amor próprio, depressão e outros assuntos psicológicos. Em outros espetáculos, como “Poema”, você também transita por temas considerados “tabus”. É quase uma marca sua trazer essas reflexões mais aprofundadas ao público. Qual é a importância de abordar esses assuntos dentro das suas peças?
JV : Essa é uma característica do meu trabalho. Essa é a forma que eu acredito que preciso me expressar, tocando nessas feridas, nessas questões que a sociedade tende a esconder. A gente vai lá e põe uma luz. Enquanto artista, acredito muito nisso, em tocar em assuntos que não são tocados por pudor ou medo. Eu não meço por onde eu devo ou não devo ir, eu simplesmente vou e vejo o resultado depois.
O musical fará temporada do dia 13 a 30 de julho, de quinta a sábado, às 20h, e domingos, às 18h. Os ingressos estão à venda no Sympla.
Foto de capa: Divulgação/Renato Pagliacci
Reportagem de Pedro Turteltaub, Nathalia Bittencourt e Karla Maia, com edição de texto de João Agner.
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Já tinha ouvido falar sobre o musical, mas foi bem interessante saber mais sobre ele através do criador do espetáculo. Fiquei bastante curiosa pra assistir. Parabéns aos repórteres pela ótima entrevista!
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