Entrevistas

A vida de quem trabalha com o perigo

Gabriela enquanto fazia uma matéria no Haiti

Dia 31 de Outubro é o dia do Repórter Policial e para comemorar a AgênciaUVA traz para vocês a entrevista com a jornalista Gabriela Moreira. Trabalhando há três anos no jornal Extra, a ex-estudante da PUC conta um pouco sobre a profissão e seus perigos.

Agência UVA – Qual é a sua trajetória profissional? Há quanto tempo trabalha como repórter policial?

Gabriela – Trabalho há três anos no jornal Extra. Comecei na editoria de Esportes e há dois anos e meio fui para a editoria Geral, para cobrir a área policial. Entrei no jornal pelo programa de Estágios. Durante um ano, passei pelo O Globo, Extra, Rádio Globo, CBN e Globo on Line. Acabei sendo contratada no Extra. Antes, eu já havia estagiado como produtora no RJ TV, da Tv Globo, e na TVE.  

Agência UVA – Sua família sente medo por você trabalhar nessa área?

Gabriela – Meus pais moram num sítio, no interior de Minas Gerais. Por isso, acabam ficando um pouco distante de toda esta realidade que enfrentamos aqui no Rio. Minha mãe é a que mais se preocupa, mas ela sabe que não adianta falar. Faço o que gosto.
 
Agência UVA – Já foi perseguida?

Gabriela – Nunca cheguei a ser perseguida, mas faz parte da nossa rotina viver situações de ameaça. Sobretudo na área policial, porque tratamos de assuntos que, na maioria das vezes, desagradam. As ameaças são constantes. E elas acontecem em diversas situações. Elas podem acontecer em enterros de traficantes, operações policiais, até a cobertura de esquemas de corrupção que envolvem políticos, empresários e outras pessoas sobre as quais não se imagina tal conduta.
 
Agência UVA – O que acha da situação atual do Rio de Janeiro? Tem alguma diferença de quando iniciou no ramo?

Gabriela – O cenário da segurança pública no Rio chegou ao extremo da falta de planejamento. E esta falta de planejamento também se extende às questões relacionadas às políticas públicas nas áreas sociais e educacionais. Concordo com a política de enfrentamento do atual governo. Não se pode mais permitir que grupos criminosos continuem agindo sem o devido enfrentamento. Mas não se pode apenas enfrentar. O atual governo tem falhado em conciliar o enfrentamento com política pública de melhorias sociais e educacionais nas comunidades. Outro ponto que vejo com preocupação é a falta de punição e a precariedade das investigações. Faltam recursos para as polícias e não se pune os maus policiais. Outra questão, que não é exclusividade do Rio, é a falta de compromisso da população com os problemas da violência. Acho que qualquer cidade, estado ou país é o reflexo das pessoas que nelas vivem. E a população continua achando que comprar CD pirata, por exemplo, não é crime. Que comprar ingresso com cambista na porta do Maracanã, não é crime. Que oferecer um agrado ao policial na blitz, não faz mal. Enquanto a sociedade continuar com este pensamento torto, as instituições continuarão tortas.
 
Agência UVA – Já passou algum sufoco durante a cobertura de uma reportagem? Qual?

Gabriela – Sufoco e cobertura policial são palavras que se completam. Já passei por diversas situações complicadas. Mas algumas me tocaram mais. Uma delas foi meu cartão de visitas à editoria de Polícia. Na primeira vez que fui fazer uma matéria em uma favela, me vi no meio de um tiroteio. Foi no Complexo do Alemão, durante as eleições de 2004. No meio do dia, polícia e traficantes se enfrentaram e uma criança morreu. A situação complicou. Eu fiquei quase uma hora entre o fogo cruzado de traficantes e policiais. Outra situação, diferente, foi a cobertura de um enterro de um miliciano. O irmão dele havia sido preso no dia anterior. Fui cobrir o enterro. Quando o irmão, que estava preso, mas foi ao enterro sob escolta chegou no velório me dirigi para falar com ele. Neste momento, os familiares do miliciano morto me atacaram. Além de me xingarem, chegaram a me agredir fisicamente.
 
Agência UVA – Tem alguma matéria que você tem vontade de realizar?

Gabriela – Tenho várias. A cobertura de segurança pública no Rio é um terreno vasto. Não tenho uma matéria, mas, sim, tipos de matéria. A matéria que gostaria de fazer é aquela que pode impedir que algum grupo criminoso se aproprie do que é público. Todas que conquistarem este objetivo me deixarão satisfeita. Outra matéria que gostaria de fazer é aquela que pode ajudar a mudar o destino de alguma família que tenha sido vítima da violência desta cidade. É outro tipo de matéria que me deixará com a sensação de dever cumprido.
 
Agência UVA – Existe um perfil denominado para ser um repórter policial?

Gabriela – Poderia dizer que o perfil é de uma pessoa destemida, corajosa, etc, mas a verdade é que a pessoa que cobre a área policial no Rio tem de ser é capaz de conviver com pessoas de caráter e posturas duvidosas e não se corromper. E para isso, a característica que não pode faltar é a honestidade e a retidão de caráter. Se a pessoa tiver estas duas qualidades, o resto é mole.
 
Agência UVA – Qual o recado que você deixa para os estudantes que têm um sonho de seguir nessa área?

Gabriela – A área tem seus problemas e rotinas chatas, como ir a enterros, velórios, tiroteios, IML… Mas se você tem o espírito de colaboração, saiba que trabalhando da forma correta e sendo honesto na profissão, você pode fazer a diferença e, quem sabe, ajudar o Rio a resolver o seu maior problema: a violência.

Vanessa Nobre • 6º período

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